ONGs acionam STF após Congresso derrubar 52 vetos à Lei Geral do licenciamento ambiental e ampliam crise entre Legislativo e governo

Organizações denunciam ‘golpe contra o clima’ e apontam inconstitucionalidades no licenciamento ambiental

ONGs anunciaram ação no STF após o Congresso restaurar 52 trechos vetados da Lei Geral do licenciamento ambiental. A medida acende um conflito jurídico e político sobre regras que afetam rios, florestas e projetos econômicos no país.

O que aconteceu

Na quinta-feira (27), o Congresso Nacional derrubou 52 vetos presidenciais à Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Entre os trechos restaurados estão regras que ampliam a dispensa e a simplificação do licenciamento, incluindo o chamado autolicenciamento amplo e geral, facilidade para obras tidas como estratégicas e a dispensa de licenciamento para atividades em imóveis rurais com Cadastro Ambiental Rural (CAR) pendente de homologação.

O governo federal havia feito um apelo para manter 63 vetos, mas não obteve sucesso. A votação ocorreu num contexto político tenso: nomes como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), haviam participado da COP30 em Belém dias antes, o que gerou críticas pelas ONGs.

Reações das organizações e citações chave

O Observatório do Clima classificou a decisão como o “pior retrocesso ambiental” da história do país e criticou que a votação ocorreu poucos dias após os presidentes do Senado e da Câmara “irem a Belém posar de defensores do clima na COP 30”.

A WWF-Brasil, por meio de Clarissa Presotti, especialista de Políticas Públicas, enfatizou que derrubar os vetos significa “ignorar a ciência, ampliar a insegurança jurídica e fragilizar a governança ambiental do país”.

Em nota, o WWF-Brasil afirmou ainda: “Diversos trechos que o Congresso decidiu restaurar são flagrantemente inconstitucionais, pois contrariam decisões do Supremo Tribunal Federal e enfraquecem competências federais e salvaguardas previstas na Licença por Adesão e Compromisso”.

Para Suely Araújo, Coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima, a derrubada dos vetos configura um “ataque aos fundamentos da nossa política ambiental”, conflitando com tudo o que o país defendeu na COP 30. Ela alertou que o texto tem uma série de “inconstitucionalidades” que são um “prato cheio para judicialização” no STF e em outras esferas.

Lucas Louback, gestor de advocacy do Nossas, acusou o Congresso Nacional de ignorar a “maior mobilização da sociedade civil brasileira e internacional na COP30” e afirmou que derrubar os vetos é “escolher retrocesso, conflito e destruição”, representando um “golpe contra o clima”.

Contexto político e judicial

A votação também foi marcada por atritos entre Executivo e Legislativo. Desde a indicação de Jorge Messias à Advocacia-Geral da União pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva houve uma escalada de tensão, e o episódio é visto por parte do governo como retaliação política. O presidente do Senado disse que a votação era “essencial para o desenvolvimento do país” e defendeu o papel do Congresso na decisão.

As ONGs já anunciaram que irão ao Supremo Tribunal Federal para questionar a restauração de dispositivos que, segundo elas, afrontam decisões anteriores da corte e complicam a governança ambiental federal. A expectativa é que temas como autolicenciamento e dispensa de licenças em áreas rurais sejam objeto de análise constitucional.

Análise breve e implicações

O retorno de dispositivos polêmicos tende a elevar a insegurança jurídica para empresas, investidores e comunidades locais, além de provocar impacto direto em políticas públicas de conservação e controle ambiental. A possível judicialização pode suspender trechos ou revertê-los, mas o processo será lento e custoso.

Do ponto de vista prático, obras tidas como estratégicas podem avançar mais rápido, porém com menor fiscalização ambiental. Isso aumenta o risco de danos a biomas sensíveis, recursos hídricos e territórios tradicionais, sobretudo quando a norma afrouxa salvaguardas federais.

Num plano internacional, a decisão fragiliza a credibilidade do Brasil em compromissos climáticos assumidos em fórum como a COP30, gerando descrédito em interlocutores que buscam segurança normativa para parcerias e financiamentos verdes.

Para cidadãos e comunidades, a disputa abre caminho para conflitos locais e maior litígio, com consequências sociais que vão além do debate técnico entre Brasília e o STF.

Como reflexão cristã breve: a tradição bíblica lembra o chamado ao cuidado da criação (Genesis 2:15) — um princípio que muitos grupos religiosos e civis interpretam como fundamento para políticas ambientais responsáveis.

O cenário seguirá de perto a atuação do Supremo. Enquanto isso, líderes religiosos moderados e organizações da sociedade civil replicam um apelo por decisões que conciliem desenvolvimento econômico e proteção ambiental, evitando decisões que ampliem risco a comunidades e à biodiversidade.

O próximo capítulo será marcado pela disputa judicial no STF e pela pressão pública nas praças e tribunais. Se a lei tornar-se fonte de conflitos constitucionais, a solução dependererá tanto das cortes quanto de um diálogo político que, até agora, mostrou-se insuficiente para acomodar interesses concorrentes.

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