Governo busca no Senado reversão do PL antifacção; cristãos atentos a segurança, lei e justiça
Uma derrota na Câmara gerou tensão política e religiosa: o PL antifacção aprovado pelos deputados acendeu um debate sobre segurança, garantias constitucionais e o papel do Estado, e agora o enfrentamento muda de palco — da Câmara para o Senado —, com o Planalto apostando em negociação para estancar o que chama de “excessos, fragilidades técnicas e pontos potencialmente inconstitucionais”.
Na prática, a derrota na Câmara deslocou para o Senado o protagonismo na revisão do texto. A articulação ficará sob comando do líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), e o Planalto deposita esperança no senador Alessandro Vieira (MDB-SE), indicado como relator, para promover uma revisão mais técnica e menos de efeito midiático. Vieira já adiantou que fará “uma revisão completa, com menos ‘pirotecnia’ do que a vista na Câmara”, acrescentando: “Vamos verificar questões de técnica legislativa, de constitucionalidade. Existem pontos de dúvida. E a grande questão será garantir o financiamento integral da Polícia Federal“.
O que motivou a reação do governo
O principal choque ocorreu em torno do relatório do deputado Guilherme Derrite (PP-SP), que, segundo o governo, retirou instrumentos centrais propostos originalmente pelo Ministério da Justiça — como infiltração policial, acesso facilitado a dados cadastrais e coordenação da Polícia Federal em operações internacionais — e incorporou conceitos e tipos penais vistos como vagos ou potencialmente inconstitucionais.
Derrite defendeu sua proposta com veemência: “O enfrentamento do crime organizado no Brasil exige legislação de guerra em tempos de paz. Exige normas que asfixiem financeiramente as organizações criminosas, silenciem os líderes, alcancem o patrimônio ilícito, desestimulem o ingresso de membros e restabeleçam o monopólio estatal da força“. Para o Planalto e técnicos do Ministério da Justiça, porém, o relatório criou “sobreposições normativas capazes de gerar nulidades” e incorporou termos como “organização criminosa ultraviolenta” cuja definição é, segundo assessores, demasiadamente aberta.
A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, criticou a tramitação e o texto: acusou Derrite de ter apresentado seis versões “de forma atabalhoada” e afirmou que o texto “está cheio de inconstitucionalidades“.
Principais mudanças aprovadas na Câmara (e que estarão no foco do Senado)
O PL aprovado pela Câmara promove alterações profundas na legislação de enfrentamento a facções e milícias. Entre os pontos que geraram maior reação estão:
Endurecimento amplo das penas: o projeto eleva significativamente as penas para crimes cometidos por integrantes de facções ou milícias — exemplos citados no texto aprovado pela Câmara incluem:
Homicídio e lesão seguida de morte: 20 a 40 anos
Roubo: 12 a 30 anos
Latrocínio: 20 a 40 anos
Sequestro: 12 a 20 anos
Extorsão: pena triplicada
Extorsão mediante sequestro: aumento de 2/3
Além do aumento de penas, o texto trouxe tipificações novas, regras mais rígidas de progressão de pena (exigindo entre 70% e 85% do cumprimento) e a transferência obrigatória de líderes de facções para presídios federais de segurança máxima.
Mudança no modelo de destinação de bens apreendidos: a Câmara decidiu dividir os recursos entre União, estados e Distrito Federal — enquanto o governo defendia a centralização no Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), considerado pelos técnicos como “mais eficiente para reforçar o orçamento e a autonomia operacional da Polícia Federal”. O modelo aprovado preocupa o Palácio do Planalto, que vê risco à fonte de financiamento da PF.
Medidas de constrição patrimonial e intervenção em empresas: o texto autoriza bloqueio e restrição patrimonial imediato, intervenção judicial em empresas suspeitas e regras mais amplas de investigação que ampliam o alcance estatal — pontos que reacendem o debate sobre garantias constitucionais e risco de abuso.
Disputa política e as vozes do Congresso
A votação foi celebrada pela direita parlamentar como um marco. O deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS) afirmou: “O Brasil não aguenta mais viver refém do crime organizado. Hoje demos um passo decisivo“. Em tom semelhante, Rodrigo Valadares (União-SE) disse que “a população clama por segurança, e o Congresso respondeu à altura“. Já o governador Ronaldo Caiado (União) avaliou que “Quem vai tirar parte do texto é o Lula, no veto“.
Ao mesmo tempo, críticas vieram de figuras como o senador Sergio Moro (União-PR), que acusou o governo de ter sido “frouxo” historicamente e afirmou que o endurecimento atual responderia a «razões políticas e eleitorais».
O papel do Senado e os próximos passos
Com o projeto no Senado, a expectativa do Planalto é de que seja possível reverter trechos que considera problemáticos e reintroduzir instrumentos excluídos pelo relator na Câmara, como a infiltração policial e mecanismos de cooperação internacional. O senador Rogério Carvalho (PT-SE) manifestou confiança: “Temos uma missão um pouco difícil, mas eu acho que a gente consegue melhorar um pouco [o texto]“.
Se o Senado promover alterações significativas, o projeto deverá voltar à Câmara para nova votação, dando aos deputados a palavra final — a menos que ocorra veto presidencial a parte do texto, como sugeriram alguns atores políticos.
Análise cristã: justiça, autoridade e limites
Para leitores que olham os fatos pela lente da fé, há duas preocupações claras: a necessidade de justiça e proteção dos mais vulneráveis, e o respeito às estruturas legais e constitucionais. A Bíblia afirma que as autoridades foram instituídas para punir o mal e proteger o bem (Romanos 13:1-4). Ao mesmo tempo, o profeta Miquéias pede justiça, amor e humildade (Miquéias 6:8) — lembretes úteis para que medidas de segurança não anulem garantias fundamentais ou prejudiquem inocentes.
Um texto legislativo que busca combater organizações criminosas deve, portanto, equilibrar firmeza com técnica jurídica, evitando termos vagos que possam ser usados de forma errática. A crítica do governo sobre a definição de “organização criminosa ultraviolenta” e as preocupações com a destinação de bens apreendidos são, nesse sentido, tanto uma disputa política quanto uma demanda por segurança jurídica.
O que acompanhar nos próximos dias
Fique atento a três pontos centrais: a atuação do relator Alessandro Vieira no Senado e eventuais audiências públicas; as propostas do governo para reinserir instrumentos como infiltração e mecanismos de coordenação internacional da PF; e o debate sobre o modelo de financiamento da Polícia Federal, que pode definir a autonomia operacional da corporação.
Para cidadãos de fé, a discussão exige oração e vigilância: rezar por autoridades e pela segurança dos mais vulneráveis, enquanto se exige que regras duras venham acompanhadas de técnica, transparência e respeito aos direitos. Em uma democracia, a proteção da sociedade e a defesa da Constituição devem andar juntas.

